quarta-feira, 20 de julho de 2011

Rio Grande do Sul e o Teatro São Pedro

Nossa próxima viagem foi ao Rio Grande do Sul. A primeira parada foi em Caixias do Sul, uma cidade com forte influência italiana na serra Gaúcha. Chegamos no aeroporto de Porto Alegre e pegamos uma van até Caxias. A van tinha um ótimo aquecimento e só pudemos sentir o frio de 1 grau quando saímos em direção ao hotel. Estava com tanto frio que não consegui ir jantar e fui direto para cama. Para piorar, nesta noite o aquecimento no quarto não funcionava e dormi toda a noite sonhando com lã, meias de lã, fazer um casaco de lã... No dia seguinte comprei um casaco, meias, botas, gorro, tudo o que pudesse fazer com que não sentisse frio, pelo menos enquanto não estivesse no palco com uma camisola de alcinha e descalça.

Nossa apresentação em Caxias foi muito especial. Havia umas 250 pessoas, mas o teatro não estava cheio. Nunca havíamos feito o espetáculo em um teatro que não estivesse abarrotado e senti a diferença. Foi um espetáculo diferente, mais íntimo, delicado. As pessoas estavam mais tímidas e o riso, que sempre aparecia no primeiro ato, dessa vez não vinha tão facilmente. Mas era perceptível a atenção e o interesse do público pelo que se passava em cena. Não sei dizer como, uma respiração, uma conexão além do que se pode comprovar, não sei dizer ao certo... Quando acabou o espetáculo, todos tivemos a impressão de tê-lo feito de uma maneira delicada e intensa. Em uma crítica sobre esta apresentação, um jornalista da cidade disse que o público também sentia tédio, também sentia a desprezível vida provinciana da qual trata Tchékov. Todos nós sentimos, não importa onde estejamos, essa é a beleza do Tio Vânia.

Em Porto Alegre não fazia tanto frio. A cidade é linda, mas o que mais me marcou foi a beleza do Teatro São Pedro. Na verdade, não sei muito bem como descrevê-lo. A impressão que tive é que a peça tinha sdo feita para aquele teatro, que tudo se encaixava perfeitamente. Impossível contar exatamente o encanto deste teatro. Já estive em vários teatros na europa, talvez até mais antigos, mas o Teatro São Pedro, e a Dona Eva, administradora do Teatro, me emocionaram muito. Os espetáculos lá foram lindos e no último dia tive a experiência artística mais tocante da minha vida. Acabamos o espetáculo e todos começaram a aplaudir e gritar bravo. Estava lotado, todas as galerias ocupadas e as pessoas de pé, gritando bravo. Foi lindo!

Falo muito da conexão com o público neste diário virtual e acredito que é por que, para mim, estar em comunhão com o público é o principal motivo pelo qual faço teatro. Fico muito feliz de o Tio Vânia, o Galpão e a Yara me permitirem isso de maneira tão intensa.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Depois de um tempo, volto ao diário das apresentações

Depois da quinta semana, seguiu-se a sexta e a sétima. A quantidade de trabalho foi tanta, que não consegui ter um tempinho de voltar aqui e escrever as impressões das apresentações e do final da temporada. Na última semana, fizemos 06 apresentações em apenas 04 dias.

Pessoalmente, acabei a temporada feliz, mas esgotada. Não tanto fisicamente, pois o espetáculo não tem uma demanda corporal muito grande, mas emocionalmente. O nível de concentração e de envolvimento que o texto exige é grande e, estar sempre no "fio da navalha," é algo que esgota. Não se pode apenas executar, repetir, é preciso vivenciar. E essa vivencia, quando se dá mais de uma vez ao dia, pode chegar a ser desgastante.

Ainda assim, fico muito feliz de ter feito uma temporada tão linda. Todos os dias, desde a primeira semana, tivemos a casa completamente cheia o que nos leva a pensar que a acolhida do público foi muito generosa. As pessoas gostam. Se emocionam e refletem sobre o vazio existencial de cada uma das personagens. Encontram semelhanças com as situações que vivem ou viveram e sentem que saem mais fortes, ainda que com uma leve desconfiança sobre a possibilidade da felicidade. Este é o retorno que temos tidos nas conversas com o público no cenário depois de cada apresentação, enquanto retiramos algum objeto de cena.

Essa proximidade com o público é surpreendente no Galpão e revela o quão é verdadeira a frase que Eduardo repetiu nos últimos espetáculo: "agradecemos especialmente ao público que é a grande razão do nosso teatro". A primeira vez que a ouvi, durante o agradecimento, me comovi, pois há uma conexão muito especial entre os atores e o público e essa conexão é preenchida de afeto e respeito mútuos.

Além da temporada, fui convidada a participar do treinamento do Jurij, o diretor russo que está fazendo um trabalho com a outra parte do Galpão e vai dirigir a próxima montagem sobre Tchékov no final do ano. Espero ter outra oportunidade de descrever a experiência em detalhes. Agora resta dizer que tem sido especialmente prazeroso e de grande ensinamento sobre o universo do autor russo e sobre o próprio teatro, em sua essência.

Na última semana fomos para Londrina. Enfrentamos, de novo, um grande teatro. Tivemos que tirar as pernas do palco, pois a vestimenta não estava adequada, e esta operação gastou grande parte da montagem e da adaptação dos atores. No primeiro dia, quinta-feira, achamos que o espetáculo foi projetado de mais. Na intenção de projetar a voz e se fazer ouvir, não soubemos segurar tão bem a vida externa do personagem e o espetáculo, nas palavras da Yara, ficou "declarado". O Cacá Carvalho foi nos ver e comentou muitas coisas importantes para a retomada do trabalho no dia seguinte. O segundo espetáculo, na sexta, foi muito bom. Conseguimos encontrar melhor essa linha tênue entre a projeção e a vida interior, ou submarina, das palavras. Nosso desafio é encontrar isso desde o primeiro dia, agora que já colocamos o pé na estrada e a cada dia estaremos em uma cidade diferente.




quarta-feira, 1 de junho de 2011

Quinta semana - retornando às descobertas


Finalizamos a quinta semana de temporada já com certa sensação saudosa, uma vez que faltam apenas duas semanas e, depois de tanto tempo de dedicação ao Tio Vânia, é estranho pensar que não terei este contato quase diário com a personagem.

Esta quinta semana representou um retorno ao período de descobertas. Depois da chegada da Yara na semana anterior, pude repensar e reprogramar vários momentos do espetáculo, deixando a Sônia fluir mais e entendendo-a como um personagem cheio de contradições. Isso acabou dando maior humanidade à personagem.

Os cinco espetáculos foram muito bons, inclusive o de quinta que tinha sido sempre mais difícil nas semanas anteriores. Destacaria os dois espetáculos de sábado. Estávamos muito animados com as propostas que a Mônica nos trouxe na sexta e o resultado foi surpreendente.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Quarta Semana de temporada - O fio da navalha


Iniciamos nossa quarta semana de temporada na quinta-feira com uma reunião com a Yara, nossa diretora. Depois de tanto tempo de ensaios intensos e uma direção tão precisa como a da Yara, foi difícil realizar duas semanas inteiras de temporada sem poder ter o retorno externo.

Yara começou comentando o "Espia uma mulher que se mata" do Veronese que ela havia visto no fim de semana anterior em São Paulo. A ideia de montar o Tio Vânia surgiu da leitura deste texto do Veronese. Eu ainda não estava na equipe e o que se comenta é que os atores e a direção pensaram que o texto do diretor argentino havia sido "talhado" em seu grupo de atores sendo tão próprio deles que dificultaria uma outra leitura do mesmo. Assim, eles acabaram retornando ao texto original, ao próprio Tio Vânia do Tchéckov. Pela leitura que a Yara fez do espetáculo, esta percepção se confirmou. A diretora falou do ritmo mais vertiginoso da cena, falou de cada um dos personagens e comentamos sobre nossas decisões, deixando mais claro para todos as opções conscientes e inconscientes que fomos tomando durante o processo de trabalho.

A primeira apresentação de quinta foi muito correta, mas não chegou a entusiasmar. Apesar de chegarmos bem mais cedo e ensaiarmos, as quintas-feiras têm sido um pouco assim. Yara saiu dando beijos e marcando nossa conversa para o dia seguinte. Na sexta, a diretora falou muito da necessidade de "sujar" o espetáculo, falas que se atropelam, ações que devem recobrar o frescor do processo de ensaio. Para mim, particularmente, foi uma surpresa. Realmente estava fazendo o espetáculo com um rigor muito grande na marcação, com receio de continuar criando depois da estréia e levar a cena para um lugar que a direção não concordaria, principalmente com a Yara não estando em Belo Horizonte. Sendo assim, acredito que foi um alívio para todos e um desafio grande voltar a criar com o espetáculo em cartaz. O espetáculo de sexta foi delicioso de fazer, havia alí uma pulsão de criação, uma tentativa de descontruir algumas coisas que começaram a se cristalizar.

No sábado, a primeira sessão foi morna, correta, sem muito brilho. Em compensação a sessão das nove foi um dos melhores espetáculos que fizemos, estava tudo alí: o caos, a confusão, a raiva, a tristeza e o tédio, todas as emoções pelas quais os personagens passam no decorrer do espetáculo.

Ainda assim, acredito que o melhor espetáculo foi o do domingo. O quarto ato foi especialmente diferente de todos os outros dias, me permiti experimentar outros estados de ânimo com relação à despedida e o texto final saiu mais seco, menos emocionado, saiu como uma constatação da fatalidade que é a solidão. Gostei do resultado e acredito que o público também. Foi o dia em que mais fomos aplaudidos e saímos todos com uma sensação de que estávamos conquistando um pouco do que a diretora havia pedido, estávamos tentando continuar "no fio da navalha".

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Terceira semana de temporada

Terminamos a terceira semana de temporada. Acho que o espetáculo realmente pegou. É uma grande alegria chegar no teatro e saber que os ingressos se esgotaram. Dá um prazer todo especial fazer um espetáculo para casa cheia. O Galpão tem um público que é muito diferente do que eu estou acostumada. Normalmente os espetáculos que fiz aqui e em Madrid tinham um público jovem, alternativo, ligado ao teatro de uma forma geral. Tenho a impressão de que o Galpão tem o seu público muito próprio, conquistado com trinta anos de muito teatro de qualidade nos palcos e nas ruas. Pessoas mais velhas, fãns do grupo que os acompanha há anos, professores, enfim, uma grande diversidade de rostos que vemos ao final de cada espetáculo.

Saimos da terceira semana com a feliz decisão de abrir mais um horário de apresentação, sábados às 18.30. Que bom!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Segunda semana de temporada



A primeira semana de temporada do Tio Vãnia em BH foi muito intensa. Fizemos apresentações de terça a domingo em um ritmo especialmente duro por causa da estréia que sempre gera tensão e expectativa. No domingo passado, dia 01 de maio, depois do espetáculo estávamos todos repetindo a última frase de Sônia: "Nós descansaremos".



Na quinta, dia 04, voltamos animados e na expectativa de como seria o espetáculo sem a presença da Yara e sem tantos ensaios. Fizemos um exercício sugerido pela Yara: passar todo o texto com velocidade e sem parar para comentários. Realmente as frases já brotam quase sozinhas. Depois, cada um fez um exercício de percorrer os espaços e gestos de todo o espetáculo em solitário.



Os espetáculos foram bons. Há sempre um nível bom que se mantêm todos os dias. A reação do público é que varia um pouco. Os risos vem sempre nos mesmos lugares, mas a intensidade se modifica. Tenho a impressão de que há dias que nós, ou o público (não sei bem), estamos mais conectados com o drama desde o primeiro ato e outros que esta conexão começa a se forjar realmente no terceiro. É interessante a presença do cômico em Tio Vânia, ela existe, Tchekóv chama a peça de comédia, mas ela é entrecortada por uma sensação grande de opressão.



O monólogo final fala da redenção após a morte, sim, nós descansaremos, quando estivermos mortos. Também fala da vida após a morte, de uma vida pacífica, gentil e suave como um carinho. É uma imagem bela, mas difícil de aceitar. Queremos esta vida agora, em vida, acho que nenhum de nós está suficientemente seguro da vida após a morte para se consolar com esta possibilidade, por isso o final é denso e sentimos isso nos aplausos, nos rostos e cumprimentos das pessoas. Na sexta, dia 05, tenho a impressão de ter sido o melhor dia. O público estava entusiasmadíssimo. Que bom.



Normalmente vemos algumas pessoas que vêm nos cumprimentar com um peso sob os ombros. Um olhar um pouco cabisbaixo, algo preso na garganta. Outras vezes, vêm nos cumprimentar com um largo sorriso, nestes momentos, acho que não gostaram ou não entenderam a peça, ou as duas coisas. Houve uma publicação no Twiter dizendo que dava vontade de levar o Tio Vânia e a vó para casa, imediatamente a diretora, em tom de brincadeira, ligou e disse: Tem alguma coisa errada com a peça!"



Em tempos modernos, assim como os comentários do público e suas reações durante e depois do espetáculo, a crítica especializada, os amigos, entre outros, o que se publica na internet tem sido uma fonte de pesquisa da recepção do público, sempre muito interessante.



E assim vamos adiante. Hoje, segunda, é dia de descansar.



segunda-feira, 18 de abril de 2011

Estreia do Tio Vânia - começando as impressões e o diário das apresentações


Pensei em relatar aqui algumas impressões dispersas da montagem e das apresentações, descrever este processo que, sem dúvida, é um dos mais intensos e enriquecedores que já vivi.


Depois de quase seis meses de ensaios diários, muito trabalho, muitas dúvidas, algumas respostas e, principalmente, muita paixão, estrearemos o Tio Vânia em BH na próxima terça-feira, dia 26/04 no Galpão Cine Horto.


A estreia em Curitiba foi realmente muito bacana. Estava tensa, nervosa pelo desafio de encenar Tchekóv com o Galpão, com direção da Yara e, como se não fosse suficiente, no Festival de Curitiba. Mas tudo correu bem. O público recebeu o espetáculo com alegria e se emocionou muito a partir do terceiro ato. Era um teatro grande, uns 650 lugares, bem maior que as nossas experiências no Cine Horto, quando a Yara tinha reduzido a plateia de 300 lugares pela metade. Foi curioso apresentar uma peça intimista para tantas pessoas, a dificuldade do íntimo projeto foi bem contornada e as críticas foram positivas, principalmente a do Luis Fernando Ramos na Folha de São Paulo.


Agora vem outro desafio, estrear em casa. Tenho a espectativa de uma recepção diferenciada, não é público de festival, mas ao mesmo tempo é um público que vem acompanhando o trabalho do Galpão há quase 30 anos. Vai ser curioso, mas principalmente emocionante, pois estar em casa evidencia um processo muito intenso que estou vivendo: trabalhar com o Grupo que me introduziu no teatro e do qual sempre fui fã. São estas coisas boas da vida que acontecem para deixar claro que a vida é surpreendente e um tanto quanto circular. Sai de Belo Horizonte, morei fora mais de sete anos e, ao voltar, retorno para um lugar de origem, das primeiras oficinas de teatro aos 14 anos. É uma mistura de informações, coisas que aprendi com eles, que eles aprederam de professores que também ensinaram meus professores lá na Espanha. El mundo es un pañuelo.


segunda-feira, 14 de março de 2011

Toda a programação do FIMPRO já está no site www.fimpro.com.br

A programação de espetáculos e eventos do FIMPRO BH e SP já está disponível no site www.fimpro.com.br. Garanta seu ingresso!

FIMPRO - Inscrições para as oficinas

As inscrições são até dia 21/03. Aproveitem!