terça-feira, 24 de maio de 2011

Quarta Semana de temporada - O fio da navalha


Iniciamos nossa quarta semana de temporada na quinta-feira com uma reunião com a Yara, nossa diretora. Depois de tanto tempo de ensaios intensos e uma direção tão precisa como a da Yara, foi difícil realizar duas semanas inteiras de temporada sem poder ter o retorno externo.

Yara começou comentando o "Espia uma mulher que se mata" do Veronese que ela havia visto no fim de semana anterior em São Paulo. A ideia de montar o Tio Vânia surgiu da leitura deste texto do Veronese. Eu ainda não estava na equipe e o que se comenta é que os atores e a direção pensaram que o texto do diretor argentino havia sido "talhado" em seu grupo de atores sendo tão próprio deles que dificultaria uma outra leitura do mesmo. Assim, eles acabaram retornando ao texto original, ao próprio Tio Vânia do Tchéckov. Pela leitura que a Yara fez do espetáculo, esta percepção se confirmou. A diretora falou do ritmo mais vertiginoso da cena, falou de cada um dos personagens e comentamos sobre nossas decisões, deixando mais claro para todos as opções conscientes e inconscientes que fomos tomando durante o processo de trabalho.

A primeira apresentação de quinta foi muito correta, mas não chegou a entusiasmar. Apesar de chegarmos bem mais cedo e ensaiarmos, as quintas-feiras têm sido um pouco assim. Yara saiu dando beijos e marcando nossa conversa para o dia seguinte. Na sexta, a diretora falou muito da necessidade de "sujar" o espetáculo, falas que se atropelam, ações que devem recobrar o frescor do processo de ensaio. Para mim, particularmente, foi uma surpresa. Realmente estava fazendo o espetáculo com um rigor muito grande na marcação, com receio de continuar criando depois da estréia e levar a cena para um lugar que a direção não concordaria, principalmente com a Yara não estando em Belo Horizonte. Sendo assim, acredito que foi um alívio para todos e um desafio grande voltar a criar com o espetáculo em cartaz. O espetáculo de sexta foi delicioso de fazer, havia alí uma pulsão de criação, uma tentativa de descontruir algumas coisas que começaram a se cristalizar.

No sábado, a primeira sessão foi morna, correta, sem muito brilho. Em compensação a sessão das nove foi um dos melhores espetáculos que fizemos, estava tudo alí: o caos, a confusão, a raiva, a tristeza e o tédio, todas as emoções pelas quais os personagens passam no decorrer do espetáculo.

Ainda assim, acredito que o melhor espetáculo foi o do domingo. O quarto ato foi especialmente diferente de todos os outros dias, me permiti experimentar outros estados de ânimo com relação à despedida e o texto final saiu mais seco, menos emocionado, saiu como uma constatação da fatalidade que é a solidão. Gostei do resultado e acredito que o público também. Foi o dia em que mais fomos aplaudidos e saímos todos com uma sensação de que estávamos conquistando um pouco do que a diretora havia pedido, estávamos tentando continuar "no fio da navalha".

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Terceira semana de temporada

Terminamos a terceira semana de temporada. Acho que o espetáculo realmente pegou. É uma grande alegria chegar no teatro e saber que os ingressos se esgotaram. Dá um prazer todo especial fazer um espetáculo para casa cheia. O Galpão tem um público que é muito diferente do que eu estou acostumada. Normalmente os espetáculos que fiz aqui e em Madrid tinham um público jovem, alternativo, ligado ao teatro de uma forma geral. Tenho a impressão de que o Galpão tem o seu público muito próprio, conquistado com trinta anos de muito teatro de qualidade nos palcos e nas ruas. Pessoas mais velhas, fãns do grupo que os acompanha há anos, professores, enfim, uma grande diversidade de rostos que vemos ao final de cada espetáculo.

Saimos da terceira semana com a feliz decisão de abrir mais um horário de apresentação, sábados às 18.30. Que bom!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Segunda semana de temporada



A primeira semana de temporada do Tio Vãnia em BH foi muito intensa. Fizemos apresentações de terça a domingo em um ritmo especialmente duro por causa da estréia que sempre gera tensão e expectativa. No domingo passado, dia 01 de maio, depois do espetáculo estávamos todos repetindo a última frase de Sônia: "Nós descansaremos".



Na quinta, dia 04, voltamos animados e na expectativa de como seria o espetáculo sem a presença da Yara e sem tantos ensaios. Fizemos um exercício sugerido pela Yara: passar todo o texto com velocidade e sem parar para comentários. Realmente as frases já brotam quase sozinhas. Depois, cada um fez um exercício de percorrer os espaços e gestos de todo o espetáculo em solitário.



Os espetáculos foram bons. Há sempre um nível bom que se mantêm todos os dias. A reação do público é que varia um pouco. Os risos vem sempre nos mesmos lugares, mas a intensidade se modifica. Tenho a impressão de que há dias que nós, ou o público (não sei bem), estamos mais conectados com o drama desde o primeiro ato e outros que esta conexão começa a se forjar realmente no terceiro. É interessante a presença do cômico em Tio Vânia, ela existe, Tchekóv chama a peça de comédia, mas ela é entrecortada por uma sensação grande de opressão.



O monólogo final fala da redenção após a morte, sim, nós descansaremos, quando estivermos mortos. Também fala da vida após a morte, de uma vida pacífica, gentil e suave como um carinho. É uma imagem bela, mas difícil de aceitar. Queremos esta vida agora, em vida, acho que nenhum de nós está suficientemente seguro da vida após a morte para se consolar com esta possibilidade, por isso o final é denso e sentimos isso nos aplausos, nos rostos e cumprimentos das pessoas. Na sexta, dia 05, tenho a impressão de ter sido o melhor dia. O público estava entusiasmadíssimo. Que bom.



Normalmente vemos algumas pessoas que vêm nos cumprimentar com um peso sob os ombros. Um olhar um pouco cabisbaixo, algo preso na garganta. Outras vezes, vêm nos cumprimentar com um largo sorriso, nestes momentos, acho que não gostaram ou não entenderam a peça, ou as duas coisas. Houve uma publicação no Twiter dizendo que dava vontade de levar o Tio Vânia e a vó para casa, imediatamente a diretora, em tom de brincadeira, ligou e disse: Tem alguma coisa errada com a peça!"



Em tempos modernos, assim como os comentários do público e suas reações durante e depois do espetáculo, a crítica especializada, os amigos, entre outros, o que se publica na internet tem sido uma fonte de pesquisa da recepção do público, sempre muito interessante.



E assim vamos adiante. Hoje, segunda, é dia de descansar.